Qual a importância dos quilombos para os escravos usados

"Quilombo é toda habitação de negros fugidos que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados nem se achem pilões neles", disse D. João V, rei de Portugal, em 2 de dezembro de 1740. Portanto, a definição acima é clara quanto à importância dos quilombos na nossa história.

No Brasil, os quilombos (mocambos) possuíam vários tamanhos e sua organização variava de acordo com o tamanho de sua população. Eles formavam Estados paralelos ao Estado português, com suas próprias leis. Os maiores, como Palmares, tinham uma população em torno de 20 mil habitantes, o de Campo Grande 10 mil habitantes. Aquilombados, os escravos lutavam pela sua liberdade e preservação de suas heranças culturais.

Na obra, Quilombos resistência ao escravismo, o pesquisador Clóvis Moura afirma que existiram de norte a sul do Brasil. Ou seja, onde existisse escravidão. Através do aquilombamento, os escravos lutavam contra o escravismo. Atuavam por meio de saques e guerrilhas. Além disso, eram aceitos, no quilombo, indivíduos mantidos à margem da sociedade como índios, mamelucos e brancos pobres.

Violência oficial

Então, qual era a postura do Estado escravista frente aos quilombos? De acordo com Moura, ele agiu com toda força que o aparato judiciário lhe permitia. Através do tripé: tortura, ação do capitão-do-mato na captura de fugitivos e milícias armadas. Dessa forma, o Estado procurava impedir de todas as formas que os mocambos se espalhassem pelo País. 

Para garantir sua sobrevivência, os quilombos realizavam um comércio ilegal, o que lhes permitia conseguir armas e produtos inexistentes em suas comunidades. Agricultores comunitários, eles plantavam para suprir suas necessidades. O excedente era comercializado no entorno. Aproveitavam, também, os recursos naturais que cada região oferecia através da caça, pesca e coleta.

Para o pesquisador e históriador Décio Freitas, os quilombos dividem-se em sete tipos: agrícolas, extrativistas, mercantis, mineradores, de serviço, pastoris e predatórios.

Estado paralelo

Palmares, um dos quilombos mais organizados, fundado no início do século XVII, tinha um governo centralizado com uma monarquia eletiva, cuja preocupação fundamental era a sobrevivência e a defesa do território. A sociedade era estratificada. No alto da pirâmide, o rei, abaixo o conselho, que era formado pelos chefes locais e, por último, a população. A justiça e o direito eram transmitidos oralmente. Adultério, roubo e homicídio eram considerados crimes graves. O infrator recebia uma punição rigorosa à transgressão cometida. Palmares sobreviveu durante um século e combateu o Estado português até ser destruído pelo bandeirante Domingos Jorge Velho, em 1695.

Nessas comunidades, a religião fundiu-se num sincretismo religioso. Uma mistura de práticas religiosas africanas e católicas. O que levou, mais tarde, ao surgimento de religiões tradicionais como a umbanda e candomblé, de grande aceitação junto à população brasileira. Esse sincretismo impediu que suas tradições e crenças sagradas desaparecessem. 

Ainda de acordo com Moura, nos mocambos havia poucas mulheres. Isso levou a seguinte organização familiar: a poliandria, que permitia que uma mulher tivesse vários homens - e a poligamia, que permitia a união conjugal de um indivíduo com vários outros, ao mesmo tempo. Na realidade, essa estrutura objetivava a manutenção da identidade cultural e sobrevivência.

Sobreviventes

Atualmente, existem cerca de cem comunidades remanescentes de quilombos. Algumas delas em isolação. É o caso: da bacia do rio Trombetas com 19 comunidades (PA), a do rio das Rãs (BA), a de Mocambo (SE). No Estado de São Paulo existem 23 comunidades, entre elas a de Cafundó, em Salto de Pirapora e Mandira, Cananéia. Ainda em São Paulo, o Vale do Ribeira reúne a maior quantidade de comunidades remanescentes. A Lei Maior, no artigo 68 das Disposições Transitórias, garante aos descendentes dos quilombolas o direito de posse da terra.

Na maioria das vezes, suas terras são invadidas e as autoridades por inércia não punem os culpados como se deve. Com raras exceções de aplicação da Lei, a tendência é o desaparecimento por completo dessas populações, que ainda resistem e lutam bravamente pela conservação de sua herança cultural e valores ancestrais, cuja matriz remete à África. É bom lembrar que isso é o mesmo que atirar contra o próprio coração, ou seja, a nossa História.

(Ricardo Santos é jornalista e prof. de História)

Publicado por: RICARDO SANTOS

O Quilombo dos Palmares foi o maior quilombo que existiu na América Latina. Foi construído na região do atual estado de Alagoas e chegou a reunir cerca de 20 mil habitantes. Foi um dos grandes símbolos da resistência dos escravos no Brasil e foi alvo de expedições organizadas por portugueses e holandeses. Foi destruído em 1694 e seu líder, Zumbi, foi morto no ano seguinte em uma emboscada.

Acesse também: Entenda como se deu o funcionamento da escravidão no Brasil

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Como surgiu o Quilombo dos Palmares?

O Quilombo dos Palmares surgiu no final do século XVI, no território da capitania de Pernambuco, mais precisamente em uma região em que hoje está localizado o estado de Alagoas. O quilombo foi formado por escravos que tinham fugido de engenhos da região de Pernambuco e que escolheram a região da Serra da Barriga, na zona da mata de Alagoas.

O primeiro registro conhecido que faz menção ao Quilombo dos Palmares remonta a 1597, embora existam algumas teorias que sustentam que o quilombo já existia antes disso. Com o tempo, Palmares cresceu, tornou-se famoso, servindo de inspiração para outros escravos resistirem e fugirem. Teve cerca de 20 mil habitantes.

Foi chamado de Quilombo dos Palmares, porque foi construído em uma região que possuía um grande número de palmeiras e essas árvores possuíam inúmeras utilidades, pois forneciam alimento aos quilombolas e suas folhas eram usadas para fazer o telhado dos casebres que eram construídos.

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Primeiramente, a vida no quilombo girava em torno da questão da segurança, uma vez que portugueses representavam uma grande ameaça e frequentemente tentavam destruir Palmares. Assim, o quilombo foi construído em uma região que lhe garantisse uma segurança extra. A região que o Quilombo ficava era uma região de serra, bastante despovoada e com matas densas.

Palmares era o resultado de uma junção de mocambos, pequenos assentamentos de escravos fugidos, que foram construídos na divisa de Alagoas e Pernambuco (mas na época, tudo fazia parte da mesma capitania). No caso de Palmares, os mocambos formavam uma confederação quilombola que se estendia por um território razoavelmente vasto.

Alguns dos mocambos que formavam Palmares eram os seguintes:

  • Aqualtune;

  • Andalaquituche;

  • Subupira;

  • Cerca Real do Macaco (ou apenas mocambo do Macaco).

Esses eram alguns dos vários mocambos que formavam Palmares e de todos eles o mais importante era o mocambo Cerca Real do Macaco. Esse mocambo era o centro político de Palmares, local em que o rei do quilombo residia e que, por ser a capital, era o mais populoso e era formado por cerca de 6 mil habitantes.

A capital de Palmares possuía uma segurança rigorosa e era cercado por três grandes paliçadas (muralhas de madeira) que possuía torres de vigilância que estavam sempre atentas para garantir a segurança do quilombo. Além disso, nos arredores da muralha, existiam dezenas de armadilhas, sobretudo, fossos com estacas escondidos por palha.

O caminho que levava à entrada desse mocambo só era de conhecimento dos moradores de Palmares. A junção dos mocambos que formava Palmares era nomeada pelos quilombolas de Angola Janga (significa “pequena Angola”) o que demonstra a disposição dos quilombolas em formar um pequeno Estado africano no interior do continente americano.

O quilombo possuía estrutura de poder, de administração e de trabalho próprios. Para garantir sua sobrevivência, mantinham contato frequente com pequenos colonos e pequenas aldeias da região, com o objetivo de realizar a troca de mercadorias. Por ser um símbolo de resistência para os escravos, Palmares incentivou, direta e indiretamente, a fuga e a rebelião de escravos na região e, por isso, era encarado como uma grande ameaça pelos colonizadores.

A sobrevivência do quilombo decorria da agricultura, e os principais itens produzidos em Palmares eram mandioca (usada para produzir farinha), feijão, batata, milho e melaço (produzido do cultivo da cana-de-açúcar). A coleta também era importante para os quilombolas que consumiam palmito e outras frutas extraídas de árvores da região.

Os registros que os historiadores possuem fazem menção a dois grandes líderes do quilombo. Os únicos líderes de Palmares que conhecemos foram Ganga Zumba e Zumbi. O primeiro morreu em condições misteriosas (supostamente por envenenamento) e acredita-se que foi líder de Palmares de 1645 a 1678. Zumbi foi eleito chefe do quilombo e permaneceu como tal de 1678 a 1695 – quando foi morto pelos portugueses.

Leia mais: Entenda a inspiração em Zumbi para a criação do Dia da Consciência Negra no Brasil

Destruição de Palmares

A história de Palmares ficou marcada pela resistência e luta contra os colonizadores. No período da invasão holandesa no Nordeste (1630-1654), o quilombo registrou um crescimento expressivo, resultado da desorganização dos europeus na região que reduzia a busca por escravos fugidos e reduzia os níveis de vigilância, facilitando fugas.

De toda forma, ao longo de todo o século XVII, os habitantes de Palmares tinham de lutar para sobreviver. Inúmeras expedições de colonizadores foram realizadas visando à destruição do quilombo, sendo a primeira delas registrada em 1602. Os holandeses também organizaram expedições para acabar com Palmares, mas fracassaram.

Os portugueses, por sua vez, foram os grandes adversários dos quilombolas em Palmares. As expedições dos portugueses contra Palmares concentraram-se depois que os portugueses conseguiram expulsar os holandeses de Pernambuco. Da década de 1650 em diante, os portugueses realizaram dezenas de expedições contra Palmares.

No ano de 1678, Ganga Zumba, até então rei de Palmares, recebeu uma oferta de paz enviada pelo governador da capitania de Pernambuco, d. Pedro de Almeida. Depois Ganga Zumba foi a Recife negociar os termos da oferta de paz com o próprio governador da capitania e os termos estipulados foram os seguintes:

  • Os nascidos em Palmares seriam considerados livres;

  • Todos aqueles que aceitassem o acordo seriam retirados da serra e receberiam terras para viver;

  • Não poderiam abrigar novos escravos fugidos;

  • Os que garantissem sua liberdade seriam considerados vassalos da Coroa.

A proposta de paz foi aceita por Ganga Zumba, mas causou divisão no quilombo, porque não contemplava os escravos fugidos – esses deveriam ser entregues às autoridades coloniais e encaminhados para seus antigos donos. Essa divisão resultou na morte de Ganga Zumba e o novo líder que assumiu – Zumbi – rechaçou a possibilidade de acordo e optou pela luta.

Houve uma nova fase de lutas, até que entre 1692 e 1694, o bandeirante Domingos Jorge Velho liderou uma expedição após ter seus termos (que não eram poucos) aceitos pelas autoridades de Pernambuco. A tropa de Domingos Jorge Velho era composta por milhares de homens e possuía até mesmo canhões (levados para lá somente em 1694).

Considera-se o fim de Palmares o ano de 1694, mas a resistência quilombola na região seguiu pelos anos seguintes. O próprio Zumbi resistiu até 1695, quando foi emboscado e morto pelos portugueses. As tropas de portugueses permaneceram na região até meados do século XVIII para impedir que o quilombo ressurgisse.

*Créditos da imagem: Cassiohabib e Shutterstock Por Daniel Neves

Graduado em História