Quando falamos que a população brasileira é miscigenada o que estamos querendo afirmar

Juliana Bezerra

Professora de História

Miscigenação ou mestiçagem significa a mistura de elementos de diferentes etnias, religiões, arte, e que vão originar um terceiro elemento.

A miscigenação é uma das características marcantes do povo e da cultura brasileira. No entanto, ao longo do tempo, este conceito foi aproveitado por várias ideologias para justificar as qualidades ou os defeitos do País.

A miscigenação étnica acontece entre pessoas que não possuem as mesmas características de biotipo físico.

Não devemos usar a palavra “raça” para se referir a este fenômeno, pois para os seres humanos só existe uma raça: a humana. Atualmente, prefere-se empregar o termo “etnia” para diferenciar os distintos grupos humanos.

Para fins de estudo, a humanidade é dividida em três grandes grupos étnicos: brancos, negros e amarelos. Neste último, estão incluídos os indígenas.

Quando falamos que a população brasileira é miscigenada o que estamos querendo afirmar
Quando falamos que a população brasileira é miscigenada o que estamos querendo afirmar
Crianças de diferentes etnias

Haverá miscigenação, por exemplo, quando um(a) negro(a) e um(a) branco(a) gerarem um(a) filho(a). Por isso, não se considera miscigenação quando duas pessoas com a mesma cor da pele, mesmo que pertençam a nacionalidades diferentes, gerem outro indivíduo.

É importante destacar que etnia não se confunde com nacionalidade. Por exemplo: qual será a etnia do filho de um alemão e uma sueca (ou vice e versa)? Sabemos que a maioria dos alemães e suecos é branca, mas o que dizer daqueles que são imigrantes, porém possuem a nacionalidade alemã ou sueca? Assim, o conceito de nacionalidade é mais abrangente que o de etnia.

A miscigenação do povo brasileiro

Pela sua formação histórica, o Brasil é um país miscigenado cultural e etnicamente.

Os portugueses, que eram brancos, tiveram filhos com índias e negras. Por sua vez, os negros também se uniram com indígenas.

Os filhos nascidos dessa união foram classificados pelo tom da pele como mulatos, cafuzos e caboclos. Cada uma dessas uniões, posteriormente, receberiam outros nomes.

Isto gerou uma sociedade onde a cor da pele determinava o lugar que o indivíduo ocupava.

Veja também: Democracia Racial.

Pardos

Atualmente, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) utiliza a classificação "pardo" para aqueles que se autodeclaram miscigenados. No entanto, esta denominação existe desde o censo de 1872.

O primeiro registro da palavra pardo pode ser encontrado na Carta de Pero Vaz Caminha, que a utiliza para descrever a cor da pele dos indígenas.

Miscigenação no Brasil

A miscigenação do Brasil foi tema de estudo de vários pensadores e até hoje esta questão é debatida pelos movimentos negro e indígena.

Durante a maior parte da história brasileira, notamos que a miscigenação ocorre pela via masculina. O branco europeu tinha filhos com a indígena e a negra. Isso reflete o poder do homem na sociedade colonial.

Abaixo fazemos uma pequena cronologia de como o conceito de miscigenação foi entendido no Brasil:

Miscigenação no século XIX

Quando falamos que a população brasileira é miscigenada o que estamos querendo afirmar
A Redenção de Cam (1895), Modesto Broco (Museu Nacional de Belas-Artes, Rio de Janeiro). A pintura expressa que os negros no Brasil desapareceriam em três gerações.

Na segunda metade do século XIX, parte da elite brasileira se perguntava sobre os motivos do atraso brasileiro em relação aos outros países. Uma das ideias mais difundidas, especialmente pelo Positivismo, era que a mestiçagem não era algo bom.

Assim, começa-se o processo de branqueamento da população, com a vinda de vários imigrantes europeus para trabalhar nas fazendas de café.

Parte da elite acreditava que os brancos se uniriam com os negros e estes desapareceriam do território nacional.

Miscigenação na Primeira República (1889-1930)

Com a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, surgem uma série de autores que defendem que o Brasil era mestiço e isto era algo que deveria ser superado.

Desta maneira, a mestiçagem é vista como algo negativo. Para isso acontecer, os mestiços devem embranquecer, pois o branco é considerada a etnia "superior".

Surgem livros como “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, que também dão ênfase ao meio geográfico para que um povo possa florescer e progredir.

Miscigenação na Era Vargas - Décadas de 30 e 40

Com a publicação de “Casa-Grande e Senzala”, de Gilberto Freyre, a mestiçagem ganha um valor positivo.

Segundo Freyre, a miscigenação de etnias produziu um país onde viviam em harmonia, sem grandes conflitos sociais. A expressão “democracia racial” foi usada para definir o Brasil.

Embora Freyre rompa com a noção pessimista dos positivistas, sua teoria acabou por mascarar os problemas sociais que negros e indígenas sofriam no Brasil. Afinal, estes dois grupos não tinham representação na elite brasileira.

Miscigenação na segunda metade do século XX

Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o mundo passa por uma profunda revisão dos conceitos de raça, etnia e nação. O conflito, que foi especialmente duro com as minorias, abriu espaço para discussões sobre este tema.

O movimento de descolonização da África e as lutas pelos Direitos Civis dos negros nos Estados Unidos fazem surgir uma nova maneira de pensar a miscigenação.

Algumas interpretações utilizaram as teorias econômicas marxistas para explicar o fenômeno, como o pensador Florestan Fernandes. Desta maneira, percebe-se que no Brasil, quanto mais escura a pele de uma pessoa, mais ela teria menos chances de ascensão social.

Miscigenação e Embranquecimento

Atualmente, o conceito de miscigenação vem sendo questionado no Brasil. Essa reflexão surge a partir do momento quando os miscigenados se dão conta que estariam numa espécie de limbo, entre o negro e o branco.

Também o movimento em favor das cotas raciais ajudou a questionar a definição de mestiço no Brasil.

Geralmente, as pessoas que têm ascendentes negros, mas possuem a cor da pele clara, não se identificam como negras, mas sim, como brancas.

A miscigenação só é vista de forma positiva quanto mais clara for a cor da pele, mais liso for o cabelo e menos pronunciado for o nariz, por exemplo.

Por isso, a condição do miscigenado vem sendo revista. Isto ajudou autores como Machado de Assis ou a compositora Chiquinha Gonzaga, serem reivindicados como negros.

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  • Cultura Brasileira
  • Identidade Cultural
  • Racismo
  • Casa-Grande e Senzala

O povo brasileiro é resultado de um processo chamado de miscigenação, isto é, a mistura de várias etnias. Por essa razão, a população brasileira é classificada como multirracial.

A história da composição da população do Brasil pode ser contada pelo processo de formação do país, especialmente a partir da chegada dos navegantes portugueses ao território, que mais tarde seria chamado de Brasil, no ano de 1500.

A formação dessa população miscigenada aconteceu através de diversos processos ao longo da história. Muitos povos fizeram parte do processo de formação do povo brasileiro: indígenas, africanos, europeus e asiáticos.

Isso aconteceu principalmente em razão das diferentes nacionalidades que chegaram ao país, por duas razões principais: devido aos processos de colonização e imigração. Ao chegarem aqui, juntaram-se aos povos originários que habitavam a região: os indígenas.

A presença indígena

Os povos indígenas são os habitantes originários do Brasil, quando o território ainda não tinha esse nome. Existiam inúmeras etnias indígenas que viviam na região e ocupavam diferentes espaços do território.

Nessa época, viviam em grandes comunidades, chamadas de tribos, e tinham sua subsistência baseada na utilização do que era provido pela natureza: caça, pesca e colheita de alimentos.

Estima-se que cerca de 3 milhões de indígenas habitavam a região no momento da chegada dos portugueses. Segundo a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), apenas 150 depois, em 1650, a população indígena já havia sido reduzida para cerca de 700 mil pessoas.

Atualmente, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a população indígena é de aproximadamente 800 mil pessoas.

Saiba mais sobre a Cultura Indígena.

Os colonizadores portugueses

O primeiro acontecimento que marca o início da mistura do povo brasileiro é a chegada dos colonizadores portugueses à região brasileira, datada de abril de 1500.

Ao chegarem, os portugueses depararam-se com a grande população indígena que já vivia em terras brasileiras.

A chegada dos portugueses não foi um processo pacífico para a região e para os habitantes que já viviam no território, visto que os colonizadores se interessaram pela diversidade de riquezas naturais encontradas nas terras brasileiras.

Quando falamos que a população brasileira é miscigenada o que estamos querendo afirmar
O quadro Desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro em 1500 representa a chegada dos portugueses ao território brasileiro (Oscar Pereira da Silva/1900).

Foi a partir desse acontecimento que ocorreram as primeiras miscigenações, pelo nascimento de novas gerações compostas por filhos de indígenas brasileiras e colonizadores portugueses.

O povo originário do continente africano chegou ao país por meio de um processo de escravização, a partir do século XVI.

Os africanos foram retirados de seus países, escravizados e trazidos ao território do Brasil pelos europeus, para trabalhar principalmente nas plantações de café e cana-de-açúcar que começaram a ser cultivadas. Muitos escravos também foram obrigados a trabalhar na extração em minas de ouro.

Além de serem forçados a estes rígidos trabalhos físicos, os escravizados africanos também serviam às famílias aristocratas que dominavam o poder econômico da época.

Somava-se ao processo de escravização a comercialização de escravos africanos, considerada pelos portugueses como um negócio lucrativo.

Os povos africanos foram escravizados depois de tentativas frustradas de escravização dos povos nativos do país, que - tanto quanto puderam - resistiram às tentativas portuguesas de trabalho forçado. Entretanto, é importante saber que no período inicial da colonização os indígenas também fizeram inúmeros trabalhos forçados.

A escravidão só foi abolida no país em 1888, por meio da assinatura da Lei Áurea.

Veja mais detalhes sobre a Diversidade Cultural no Brasil.

Quando falamos que a população brasileira é miscigenada o que estamos querendo afirmar
A obra Regresso de um proprietário retrata a escravidão no Brasil (Jean-Baptiste Debret/1816).

Ainda que sua chegada ao país tenha sido pelo violento processo de escravidão, os hábitos trazidos pelos povos africanos são uma das mais fortes influências da cultura do país, sendo fundamentais no processo de formação da população.

São heranças africanas que fazem parte da cultura brasileira: religiões como o Candomblé e o culto aos Orixás, a música e o hábito do consumo de alimentos como feijão e mandioca.

Veja mais sobre a cultura afro-brasileira.

A imigração europeia além dos portugueses

Algum tempo depois, começou a ocorrer o processo de imigração europeia, iniciado aproximadamente em 1850, após a proibição oficial do tráfico de escravos no país.

A partir desse momento, começaram a chegar ao país imigrantes europeus de diversas nacionalidades, que também fazem parte da formação do povo brasileiro.

Além de portugueses, chegaram ao Brasil: italianos, alemães e espanhóis. Em menor quantidade, também imigraram para o país, russos, ingleses, suíços, húngaros e poloneses, entre outros.

A chegada desses imigrantes foi fortalecida pela ocorrência de guerras no continente europeu e a maioria destes imigrantes passou a trabalhar na agricultura de grandes fazendas, principalmente as produtoras de café.

Estes imigrantes formaram colônias no país, seus hábitos e costumes também fizeram parte da formação da cultura e da sociedade brasileira.

Veja também os significados de migração e imigrante.

A imigração japonesa

Os imigrantes japoneses também fazem parte do processo de formação da população brasileira.

Os primeiros imigrantes chegaram ao país no começo do século XX e instalaram-se em São Paulo e no Paraná. Os dois estados possuem as maiores colônia japonesas ainda hoje.

A chegada desses imigrantes aconteceu especialmente pela necessidade de aumentar o número de pessoas dispostas a trabalhar nas plantações destes dois estados. O processo ocorreu a partir um acordo de abertura de imigração firmado entre os governos do Brasil e do Japão.

Estima-se que atualmente vivem no país cerca 1,5 milhões de descendentes de japoneses.

Para saber mais sobre o assunto, veja também os significados de miscigenação, identidade cultural e diversidade cultural.